Não ia postar esse texto, mas por sugestão de minha grande amiga Tânia, resolvi colocá-lo aqui, já que essas férias ainda serão longas...
Ao chegar paras as festas de fim de ano, minha mãe disse que havia reservado uma coluna de jornal para eu ler. Tratava de telenovelas e minisséries, meu objeto de estudo na Universidade. E como estudante da área, gostaria de fazer alguns comentários para que não haja nenhuma injustiça com meus futuros colegas de trabalho, autores e diretores, que tanto se preocupam em realizar bons produtos para o povo brasileiro.
Muitos erros, os quais chamamos de "erros de continuidade", realmente ocorrem na telinha. Um sinal da cruz mal feito, ou uma barbearia sem pêlos pelo chão, às vezes escapam aos cuidados da produção. Também acho difícil aceitar esses erros primários, mas na escala em que produzimos televisão no Brasil e com a qualidade que temos, são pecados perdoáveis.
Nosso país é, sem dúvidas, diverso em sotaques. Se por um lado temos apenas uma língua oficial, por outro ela é multifacetada em riquíssimos regionalismos que a tornam singular. E antes do advento da comunicação instantânea, a diferença era ainda mais patente. Sim, o povo mineiro tinha um sotaque muito mais carregado do que o atual, de "r" puxado e fala rapidinha. E assim como gaúchos, nordestinos, aos poucos fomos expandindo nossas fronteiras e aumentando ainda mais a miscigenação da língua, deixando a marca regional pouco mais sutil. O sotaque marcado, forte, muitas vezes pode prejudicar o ator, haja vista a necessidade de comunhão entre este e o papel. Eu mesmo, enquanto ator, já vivi essa experiência.
Em obras de ficção trabalhamos com o tempo dramático, um auxílio que nos permite fazer digressões e omitir fatos não relevantes ao enredo. Lavar as mãos, escovar dentes são atos implícitos ao nosso cotidiano, que não possuem carga dramática suficiente para figurarem todo o tempo. É como se um personagem que está em um hotel precisasse ir ao aeroporto: não é necessário mostrar todo o caminho percorrido; apenas sua saída e chegada. Da mesma forma em que no jornal impresso o espaço representa dinheiro, na TV tempo é igual a dinheiro. Para se ter idéia, uma única exibição de um comercial de 30 segundos em horário nobre está orçada em R$ 320 mil. Não podemos nos dar o luxo de perder esse tempo.
Tomar café da manhã às pressas ou mesmo não tomar também é algo muito comum. Eu mesmo, raramente tomo meu café da manhã em casa no período letivo. Também, o fato de a toda hora as personagens estarem comendo ou bebendo café é uma estratégia de aproximação do público. Em uma pesquisa de opinião, roteiristas da TV Globo, perceberam que o brasileiro sente-se à vontade nas refeições – é um momento sagrado, de encontro com toda a família. Por isso estão cada vez mais presentes na teledramaturgia.
Missa em latim também é algo que requer muita cautela. É do conhecimento de todos que as missas na época retratada em "Desejo Proibido" eram em latim. Mas isso causaria o afastamento do público, sendo inconveniente o uso de legendas a todo momento. Em Hollywood, pro exemplo, produz-se filmes com Jesus em inglês e ninguém contesta por que ele não está falando aramaico.
Em tempos de globalização, é cada vez mais necessário resgatar nossas origens. Se o sotaque carioca dos atores da emissora tomou conta do país e chegou a São Paulo, por exemplo, onde é ambientada "Sete Pecados" e todas as personagens falam o "carioquês" (e de fato há um erro gravíssimo de continuidade), também não podemos passar despercebidos pelo sotaque interiorano de Vera Holtz, atriz de altíssimo nível, que já disse em entrevistas ter problemas com seu sotaque, algumas vezes inadequado às suas personagens. É tudo uma questão de bom senso dos profissionais, que devem, sim, se preocupar cada dia mais em polir seu trabalho para apresentá-lo sempre impecável a essa população que tão bem nos acolhe todos os dias em seus lares.